O “Setembro Verde” é um movimento coordenado por diversas entidades (produtores, influenciadores, compradores de hortifrútis e redes de restaurantes) em parceria com a sociedade que tem como objetivo incentivar e disseminar o hábito de se alimentar de forma mais saudável. A ação visa estimular os brasileiros a consumirem mais frutas e hortaliças no dia a dia e a incentivarem amigos e familiares a manterem hábitos de alimentação mais saudáveis.
Em paralelo a esse movimento, é importante a discussão do conteúdo que define um alimento saudável. A indústria de alimentos se apropria indevidamente, de modo geral, do termo “saudável”, com produtos ultraprocessados de baixo conteúdo de produtos frescos e muitos aditivos. Sucos industrializados, barrinhas de cereais, bebidas lácteas à base de frutas e pães em formato de bisnaguinha não são exemplos de lanches saudáveis.
Saúde e bem-estar são atributos muito valorizados pelo consumidor. Segundo a consultoria Euromonitor, as vendas desse segmento movimentaram, no Brasil, R$ 93,6 bilhões, e 67% desses ganhos vieram de “alimentos saudáveis” – dados de 2016. No mesmo ano, o País foi o sétimo maior mercado global deste segmento que movimentou US$ 700 bilhões, segundo a mesma consultoria. No geral, entretanto, esse faturamento vem da indústria de alimentos processados e não da distribuição de frutas e hortaliças in natura.
As indústrias de alimentos levam o consumidor a acreditar que seus produtos são uma boa opção nutricional, incluindo no nome do produto palavras como “saudável”, “caseiro”, “caipira” ou “direto da roça”. No entanto, são conceitos incompatíveis com produtos industrializados e deveriam ser proibidos. Para separar o “joio do trigo”, é importante ter uma legislação mais rígida, fiscalização atuante e, principalmente, melhor divulgação a respeito dos alimentos que, de fato, podem contribuir para uma alimentação mais saudável. Uma outra forma de desinformação a respeito dos hábitos saudáveis é através das dietas da moda, que evitam ou reduzem o consumo de carboidratos, glúten, lactose, produtos de origem animal, entre outros. Dietas que restringem importantes nutrientes não promovem alimentação saudável para a população.
Um quebra de paradigma em termos de informação de hábitos saudáveis veio do “Guia Alimentar para a População Brasileira”, lançado em novembro de 2014 em substituição ao de 2006, elaborado pelo Ministério da Saúde (MS) em parceria com o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/USP), com o apoio da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/Brasil) e coordenado pelo professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP), Carlos Augusto Monteiro.
De repercussão modesta no Brasil, o guia foi bastante elogiado lá fora por especialistas em nutrição. A revista norte-americana World Nutrition, uma das mais respeitadas publicações na área, publicou o trabalho liderado pelo professor Carlos Monteiro e ressaltou: “os Estados Unidos precisam seguir o exemplo do Brasil: parar de falar sobre nutrientes e começar a falar sobre comida”. O guia fez tanto sucesso que foi considerado pelo portal Vox.com como o “melhor guia nutricional do mundo”.
As grandes mudanças em relação aos outros guias alimentares ocorreram tanto na classificação dos alimentos quanto na retirada da usual pirâmide alimentar. Segundo a “regra de ouro” do guia, é preferível “sempre alimentos in naturaou minimamente processados e preparações culinárias a alimentos ultraprocessados”. O guia recomenda que o brasileiro não deve abrir mão de preparar sua própria comida e a sua confecção deve ser com base em alimentos frescos – aqui, as frutas e hortaliças são as estrelas! – e minimamente processados, e condena o consumo de alimentos processados e ultraprocessados.
Assim, o “Guia Alimentar para a População Brasileira” quebra um paradigma muito apropriado pela indústria de alimentos que era se atentar nos nutrientes. A máxima do guia é comer comida “de verdade”, aquela conhecida como “comida da vovó” e dar prioridade a produtos frescos, minimizando, o máximo possível, o consumo de industrializados.
Neste mês de setembro, é importante ampliar a discussão sobre o que é de fato comida saudável e “de verdade”. É bom para a saúde e ótimo para o bolso, tanto de consumidores quanto de produtores de frutas e hortaliças. Além disso, a crise econômica atual está trazendo o brasileiro de volta à cozinha. Assim, a ação “Setembro Verde” é oportuna para resgatar esse conceito difundido pelo guia e aumentar a participação das frutas e hortaliças no prato do brasileiro com comida “de verdade”.
Margarete Boteon – Professora da Esalq/USP e pesquisadora do Cepea