Por Rosana Higa
Pesquisadora da Embrapa Florestas, especialista em mudanças climáticas
Grande parte dos estudos internacionais relacionados com mudanças do clima está centrada nas emissões de gases de efeito estufa para implementação de medidas de mitigação. Esse esforço é fundamental, mas também há consenso de que os esforços para apoiar sistemas ameaçados pelas alterações do clima, em parte irreversíveis, são mais urgentes do que nunca, em escalas local e global.
O planejamento da produção agrícola e florestal em uma situação de mudança do clima exige tomada de decisão baseada em práticas de gestão adaptativa e melhorias contínuas que incluam ciência. Também exige avaliação de especialistas, uso de indicadores relevantes para o clima e sistemas para medir e acompanhar a eficácia das ações de adaptação. Inclui ainda observação e monitoramento, controle de fronteiras e inspeções, especialização em avaliação de risco, ferramentas de diagnóstico para detecções antecipadas. Os impactos adversos da variabilidade climática sobre a produção agrícola e florestal estão ganhando mais atenção no campo da pesquisa, com um número crescente de estudos focando a inter-relação entre clima, sistemas de produção e os custos de adaptação associados.
A mudança climática é inevitável e as espécies responderão de formas diferentes. Assim, é necessário poder contar com a maior diversidade de recursos genéticos para enfrentar as eventuais ameaças provocadas pela mudança do clima. Precisamos manter a biodiversidade, incluindo variedades de culturas tradicionais e melhoradas e seus parentes silvestres.
Um bom exemplo de ações para construir resiliência em face de incertezas devido a mudanças climáticas está no domínio dos recursos genéticos, alguns utilizados em outros lugares considerados menos importantes, mas que podem ter grande relevância no futuro, ao serem adaptados. Também de grande importância são os germoplasmas ameaçados pelas mudanças climáticas, indispensáveis para os processos de adaptação.
O acesso ao material genético pode impactar significativamente o agronegócio e atenção especial deve ser considerada com recursos florestais. Ciclos produtivos mais longos dificultam a caracterização do impacto e medidas de adaptação e, portanto, a análise de riscos e vulnerabilidades.
Uma discussão sobre os riscos potenciais pode ser obtida na cultura do eucalipto, cujas plantações apresentam, no Brasil, as maiores produtividades do mundo, resultado de investimento em práticas silviculturais e melhoramento genético. A maioria dos plantios comerciais são de florestas intensamente selecionadas para produtividade e qualidade da madeira. Entretanto, secas ocorridas no Sudeste no período de 2013 a 2015 afetaram 150 mil hectares de plantações, causando grandes perdas. Esse fato, aliado à expansão dos plantios em novas áreas, muitas propensas ao déficit hídrico, tem forçado a ampliação da base genética intraespecífica ou mesmo a inclusão de novas espécies nos programas de melhoramento genético.
O problema é que muitas populações em áreas de ocorrência natural do eucalipto na Austrália, fornecedoras da base do material genético usado no Brasil, foram desmatadas ou transformadas em Parques Nacionais onde agora é proibida a coleta de material. Portanto, se o material introduzido no Brasil precisa ser conservado ou importante ferramenta para adaptação será irreparavelmente perdida.
Embora as pesquisas realizadas sugiram importantes caminhos, existem lacunas sobre impactos das mudanças climáticas e estratégias de adaptação mais apropriadas. É importante ainda considerar os potenciais efeitos colaterais adversos das estratégias adaptativas, a fim de evitar soluções mais danosas que o problema e os riscos decorrentes de pressões não climáticas que atuam como multiplicadores.
Assim, a estratégia de conservação, particularmente de locais e espécies, deve ser prioridade e todo esforço possível deve ser empregado para enfrentar um futuro de incertezas.